Back to top

5.1 Bloco Operatório – O que Podemos Fazer para Evitar Lesões?

A patologia músculo-esquelética associada a problemas posturais no Bloco Operatório (BO) é hoje uma temática relevante para um oftalmologista.

Este capítulo tem como objetivo identificar os potenciais riscos a que um cirurgião oftalmológico está exposto, de modo a ser possível uma tomada de consciência da postura adotada por cada um.

A Ergoftalmologia espera contribuir para uma atitude preventiva de potenciais patologias futuras, através de estratégias simples de mudança de hábitos posturais.

Sabe-se atualmente que o oftalmologista apresenta um grande risco de desenvolver patologia músculo- esquelética, este risco é maior nesta área do que em outras especialidades médicas.1

Alguns estudos vieram confirmar esta afirmação:

- Chatterjee A. e colaboradores2 revelaram que 54% dos oftalmologistas do Reino Unido sofriam de lombalgias, apresentando mais queixas consoante os anos de profissão.2
Nove cirurgiões necessitaram mesmo de intervenção cirurgica.2

- Dhimitri KC. e colaboradores3 (2005), num questionário a oftalmologistas americanos, concluíram que 51,8% sentiram cervicalgias e lombalgias no último mês de trabalho, 15% com limitações ligeiras a moderadas no exercício da prática clínica.3

- Um estudo de Chams H. e colaboradores4 revelou que 80% dos participantes apresentavam lombalgias e cerca de 55% apresentavam cefaleia crónica.4
Outras patologias de causa profissional estavam também mais associadas aos oftalmologistas, como problemas visuais relacionados com o LASER e com o uso de microscópio no BO (15%).4
As queixas visuais foram mais prevalentes nos cirurgiões vítreo- retinianos (p < 0,004).4

- Já Jonathan N. e colaboradores5 observaram que 60% dos oftalmologistas no Reino Unido sofriam de cervicalgias ou lombalgias, ou de ambos.5
Estes números eram mais alarmantes quando avaliaram os oftalmologistas no BO, em que 33,6% reportaram dores enquanto operavam e 78,6% afirmavam que a cirurgia exercia um efeito exacerbador das queixas álgicas.5
Por este motivo, alguns oftalmologistas diminuiriam as horas despendidas no BO.5
Os cirurgiões mais afetados pelas cervicalgias foram, em primeiro lugar, os de vítreo-retina, seguidos pelos de oculo-plástica e de glaucoma, o que poderá estar relacionado com a duração da cirurgia.5

- Um estudo realizado por Al-Juhani M. e colaboradores6 revelou que as cervicalgias e lombalgias eram tanto apresentadas por oftalmologistas mais novos, como por mais velhos, revelando que a sintomatologia álgica não está unicamente relacionada com os anos de profissão, sendo um problema transversal a todos os oftalmologistas.6

- O estudo de Kitzmann A. e colaboradores7 confirmou a maior prevalência de cervicalgias e lombalgias nos oftalmologistas, quando comparados com médicos de família.7

No BO, durante a realização de uma cirurgia, é possível identificar vários condicionantes inerentes ao aparecimento de patologia músculo-esquelética, sendo eles:

1. Movimentos repetitivos, realizados em condições de stress e de esforço cognitivo, inerentes a uma cirurgia, que são fatores exacerbadores de cefaleia e cervicalgia.5,8

2. Tarefas que requerem um controlo muito fino, com necessidade de visão de perto, o que provoca tensão muscular na cabeça, pescoço e membros superiores.8

3. Manutenção de uma postura, muitas vezes inadequada, durante um longo período (cirurgia), com a condicionante da imobilidade exigida nesta posição extrema.1,8

Apesar de não ser a única especialidade que utiliza o microscópio durante a cirurgia, na oftalmologia este problema é ainda mais dramático, dado que além do BO, também em ambiente de consulta (observação à lâmpada de fenda) e na realização de exames complementares de diagnóstico e tratamento (LASER), a postura é muitas vezes inadequada.1

Quando se está a utilizar o microscópio é possível identificar várias fontes de problemas posturais:

- Cabeça em extensão, possível fonte de espasmos e contracturas musculares.8

- Braços em suspensão, com toda a força estática a ser aplicada nos ombros.8

- Segurar instrumentos extremamente delicados, o que obriga a aplicação de bastante força em movimentos finos e precisos durante longos períodos, em condições de imobilidade.8
Muitas vezes demasiado alto ou baixo, com angulação incorreta dos membros e sem suporte, o que é causador de dores nos ombros, síndrome do canal cárpico e mesmo tendinites.8

- Má posição dos membros inferiores, o que parece exacerbar todo o mau posicionamento do cirurgião e ser também fonte de desconforto durante a cirurgia.8

Se observarmos melhor a posição em que o cirurgião se encontra enquanto está a operar percebemos que o tronco está sujeito a uma imensa tensão, sendo a base de sustentação para a coordenação simultânea da cabeça, que está a olhar para o microscópio, membros superiores, que seguram os instrumentos, e dos membros inferiores, que coordenam o pedal do microscópio e do aparelho de ultrassons, no caso da cirurgia de catarata.9

Dados sobre a má postura apresentada pela maioria dos oftalmologistas no BO revelam que a flexão/extensão do pescoço num excesso de apenas 15° pode estar associada a sintomas cervicais.5

Devido a esta hiperextensão estática ao microscópio, problemas como patologia degenerativa nos discos vertebrais e hérnias discais é também mais frequentes neste grupo de médicos.1,8

Todos estes fatores em conjunto poderão provocar patologia músculo- esquelética grave que, em última análise, poderá ser responsável pela necessidade de paragem da atividade profissional e mesmo de correção cirúrgica.1,8

No entanto, poucos cirurgiões conseguem reconhecer que a sua postura está incorreta, não sabem também qual a melhor postura a adotar, de modo a evitar o dano relacionado com a postura no BO.1

 

Sugestões para corrigir a postura no bloco operatório...

A cadeira do cirurgião deve ter um encosto para as costas e deve ser ajustada de modo a que os joelhos estejam dobrados a 90°, com os pés apoiados no pavimento/pedais, com as coxas paralelas ao solo (Fig. 1).5,9

Se necessário, de modo a evitar desnivelamento dos membros inferiores, um estrado metálico poderá ser colocado para que se observe um equilíbrio na altura dos dois membros.9

Só após o bom posicionamento do cirurgião é que deverá ser ajustada a marquesa do doente e o microscópio.5,9

Este último e as suas oculares, que devem ser móveis, devem ser ajustados de modo a que o tronco e pescoço do cirurgião se mantenha direito, sem flexões ou extensões do mesmo (Fig.2).5,9

 

 

Fig. 1. Posição correta dos membros inferiores.  Fig. 2. Posição correta da cabeça e pescoço.

 

Muitas vezes, principalmente os cirurgiões mais altos, estão inclinados sobre o microscópio durante todo o tempo cirúrgico, com dores ao nível do pescoço e possível dormência dos membros superiores.1

A sugestão é colocar o cilindro do microscópio mais para cima, de modo ao cirurgião se sentar com o tronco e o pescoço direitos, como se o cirurgião estivesse a olhar para um ponto, à altura dos seus olhos, na parede em frente.

Este equilíbrio poderá não ser fácil se o cirurgião e o ajudante tiverem alturas muito diferentes, podendo o ajudante ficar numa posição desconfortável e potencialmente danosa.1,9

Os apoios de braço não são geralmente aconselhados nas cirurgias em que o doente está acordado, pois se os braços estiverem “presos” numa mesma posição não conseguem tão facilmente acompanhar pequenos desvios da cabeça do doente, dificultando a visualização do reflexo vermelho do olho, por exemplo, na cirurgia de catarata.1

Nas cirurgias em que o doente está com anestesia geral, esta poderá ser uma opção, no nosso Hospital, por exemplo, o apoio de braços é utilizado em cirurgia de mácula, pela necessidade de uma posição imóvel, mantida e precisa, em que a área que necessita de ser melhor visualizada é central.

Por último, o cirurgião deverá fazer exercício físico, de modo a compensar a postura viciosa, que muitas vezes adota, e assim fortalecer os músculos, evitando tensão muscular excessiva durante a cirurgia.9

A Academia Americana de Oftalmologia lançou mesmo alguns exercícios, de modo a ajudar o relaxamento muscular e a prevenir patologia músculo-esquelética (vide item Bibliografia 9).9

No futuro, este será um problema possivelmente evitado através dos novos sistemas de cirurgia com visualização através de televisão, usando um sistema de óculos de 3 dimensões.1

Deste modo, o cirurgião irá olhar em frente, para um monitor colocado à altura dos seus olhos, não havendo o risco de se colocar curvado sobre um microscópio.1

Atualmente, como o uso de microscópio no BO é a nossa realidade, o nosso conselho é mesmo a prevenção.

O que podemos fazer para evitar lesões?

Adotar uma postura correta no BO é a chave para evitar lesões futuras.

Autore(s)

Serviço de Oftalmologia do Hospital Professor Doutor Fernando da Fonseca E.P.E.. Lisboa, Portugal

(Direção de Serviço: Isabel Prieto)

Serviço de Oftalmologia do Hospital Professor Doutor Fernando da Fonseca E.P.E.. Lisboa, Portugal

(Direção de Serviço: Isabel Prieto)

Serviço de Oftalmologia do Hospital Professor Doutor Fernando da Fonseca E.P.E.. Amadora, Portugal

(Direção de Serviço: Isabel Prieto)

Serviço Oftalmologia do Hospital Prof. Dr. Fernando Fonseca E.P.E.. Amadora,Portugal

(Direção de Serviço: Isabel Prieto)

Serviço de Oftalmologia do Hospital Professor Doutor Fernando da Fonseca E.P.E.. Lisboa, Portugal

(Direção de Serviço: Isabel Prieto)