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4.3 Onde devo colocar o meu computador?

Vemos com o nosso cérebro. Os olhos codificam os estímulos recebidos pela retina, e o nervo ótico e as vias óticas transmitem esta informação ao córtex visual.

Os dois olhos são dirigidos para o objeto, de modo que a mesma imagem se forme em ambas as retinas. O cérebro pode então processar esta informação numa sensação visual binocular1.

Os movimentos dos olhos humanos devem-se à ação de seis pares de músculos extraoculares. Quando olhamos para um objeto distante, estes músculos mantêm os eixos dos olhos paralelos.  Se fixarmos um objeto próximo, os eixos dos olhos convergem para o objeto.

No interior do globo ocular encontra-se o músculo ciliar, que tem a função de aumentar os raios de curvatura e consequentemente a potência do cristalino quando olhamos para perto.

O cristalino é uma lente de potência variável que nos permite a capacidade de acomodação, projetando na retina a imagem dos objetos, de modo a poder ver-se com nitidez os objetos situados entre os pontos remoto e próximo dos olhos.

A capacidade de acomodação diminui com a idade. Se a intensidade da luz envolvente aumentar ou diminuir, os músculos intraoculares, esfincter e dilatador da pupila, diminuem ou aumentam o diâmetro daquela.

Existe também uma adaptação da retina de modo a que nos possamos adaptar à obscuridade e à luz (Fig1). Cerrar as pálpebras é igualmente um mecanismo de defesa contra a luz excessiva. As pálpebras são responsáveis pelo pestanejo. Este consiste num movimento rápido de descida da pálpebra superior, efetuado pelo músculo orbicular dos olhos, e na sua elevação, feita pelo músculo levantador da pálpebra superior.

O pestanejo é crucial para manter íntegra a película lacrimal, da qual depende a integridade da córnea e da conjuntiva. Podemos contabilizar o número de músculos que “trabalham” cada vez que olhamos desde o fundo da  sala para o ecrã, teclado e documentos. Além disso, pestanejamos com menos frequência.

 

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Fig. 1– As estruturas do olho

 

Os olhos e o cérebro humanos não foram “pensados” para uma visão ao perto prolongada.

Podemos passar várias horas por dia em frente de ecrãs de vários tamanhos: telemóvel, tablet, computador portátil ou fixo, participando em videoconferências, vendo televisão.

É, portanto, normal que ao fim de algumas horas sintamos fadiga visual, cefaleias (dores de cabeça), vertigens...A astenopia digital afeta 60% de todos os utilizadores, acompanhada de dores ósseas, articulares e musculares e perturbações endócrinas afetando a secreção da melatonina e do cortisol2.

Como minimizá-las? Através da criação de novas técnicas diagnósticas, de protocolos personalizados, de progressos na ótica e na tecnologia das lentes e da informação e esclarecimento dos utilizadores.

Em primeiro lugar, o trabalhador deve avaliar o seu estado de saúde e a sua função visual.

Deverá ter uma boa função visual, idealmente sem ter que recorrer ao uso de correção ótica.

Porém, se essa necessidade existir, haverá que usá-la e mantê-la atualizada; 60% da população portuguesa precisa de usar correção ótica3. A existência de um astigmatismo, mesmo pequeno, obriga à sua correção.

A relação com o meio exterior através da visão depende da integridade do sistema visual.

A informação colhida pelos olhos e posteriormente tratada pelo cérebro é relacionada com as experiências vividas, sendo a compreensão da perceção visual o resultado da comparação com as experiências memorizadas por todos os sentidos (audição, gosto, olfato, tato, sensibilidade propriocetiva de todos os órgãos e postura corporal).

Qualquer alteração destas condições no indivíduo poderá interferir no rendimento visual, desempenhando a postura um papel relevante4.

Assim, um dos campos da Ergoftalmologia é o estudo dos ambientes de escritório.

As tecnologias de informação e comunicação introduziram novas exigências.

Aos problemas postos pelo cálculo dos níveis de iluminação, reflexão, encandeamento, contraste, cintilação, para citar alguns, somam-se as questões da escolha de um ecrã de visualização, a localização do mesmo e o consequente planeamento do espaço.

Estas questões são de extrema importância para os que exercem a sua profissão em casa.

A comunicação no ciberespaço fez surgir o trabalho à distância, o teletrabalho.

Aqueles que realizam o seu trabalho em casa deverão também adotar procedimentos de organização do trabalho e dos espaços, já que normalmente não têm um programa de segurança e saúde no trabalho5: a Linha de visão paralela à janela organização do espaço de trabalho é fundamental. “Onde devo colocar o meu computador?”

Nunca fique virado de frente para uma janela.

O seu eixo visual deve ficar paralelo à janela, portanto o ecrã ficará perpendicular à janela e o utilizador sentado em frente dele (fig.2).

A distância a que a janela se encontra deverá ser superior a 1,5 metros.

Nunca se vira o ecrã para uma janela. Não devem existir reflexos provenientes de janelas ou de iluminação artificial.

É necessário escolher e dispor as fontes de luz artificial de modo a que não ocorram reflexos suscetíveis de causar encandeamento.

Após ter colocado o ecrã diretamente à sua frente, incline-o ligeiramente para cima.

O plano do ecrã deve ser paralelo à sua face e ser perpendicular ao seu eixo visual.

Num ecrã de 14 polegadas (que é o tamanho da maioria dos computadores portáteis) o centro está cerca de 15º abaixo do eixo visual.

Num ecrã de 17 polegadas o centro situa-se 20o abaixo do eixo visual.

Quando trabalha, após ajustar o brilho e o contraste para que os carateres e gráficos apareçam bem definidos, use o contraste máximo, que é obtido usando carateres brancos em fundo negro ou carateres negros em fundo branco, cinza ou bege muito claros.

Nunca trabalhe com um tamanho de letra menor que 8, o tamanho 12 deverá ser usado em períodos de trabalho mais prolongados.

Escolha letras sem serifa, como por exemplo o lettering Arial.

Mantenha o ecrã limpo.

O computador está colocado sobre um plano de trabalho, portanto a questão seguinte será: “Como devo escolher a minha secretária?”

 

 

Fig.2 - Colocação dos postos de trabalho.

 

O plano de trabalho deveria ser ajustável em altura, adaptado à pessoa que o vai utilizar.

Isto é muito importante devido à colocação do teclado: os ombros, cotovelos e punhos do utilizador deverão estar em posturas neutras.

Os ombros estão relaxados, os braços estão colocados ao longo do tronco, os cotovelos fletidos a 90o e os punhos estão na continuidade do antebraço, idealmente ligeiramente fletidos, como a “mão do pianista”.

Os punhos nunca deverão estar em extensão, para prevenir patologias do túnel cárpico.

A superfície da secretária deverá ser suficientemente ampla para acomodar o monitor, teclado, rato, documentos.

Estes deverão ser colocados num porta-documentos que os coloquem numa posição mais favorável para o utilizador5.

Um candeeiro de secretária deverá situar-se à esquerda de um utilizador dextro, ou à direita no caso de usar a mão esquerda e não deve provocar reflexos no ecrã.

O material de que é feito o tampo da secretária não deverá provocar reflexos.

“ E a minha cadeira?”

Deverá permitir-lhe sentar-se com segurança, tendo uma base que pode girar 360º sobre o seu eixo e 5 pernas com rodízios.

As caraterísticas do assento devem ser adequadas: a altura, a largura e a profundidade devem permitir que as articulações das ancas, joelhos e tornozelos fiquem em posição neutra.

As articulações da anca, joelhos e tornozelo devem fazer um ângulo de 90º.

Não se deve cruzar as pernas, para as tuberosidades isquiáticas dos ossos coxais (os ossos da bacia) ficarem ao mesmo nível.

Os pés ficam completamente apoiados no solo ou num apoio de pés.

Deve ter um revestimento que não seja demasiado duro nem demasiado mole, que seja poroso e que não seja derrapante5.

Deve possuir um encosto que faça um ângulo de 100 a 105o com o plano do assento e tenha apoio lombar.

Deve ter apoios para os antebraços reguláveis em altura, suficientemente largos e almofadados.

Sente-se apoiando as costas no encosto, coloque os braços ao longo do tronco, coloque os cotovelos fazendo um ângulo de 90º.

A cabeça estará ligeiramente fletida em relação ao tronco, cerca de 5º.

A cabeça excessivamente fletida causará problemas vários no esqueleto, articulações e músculos do pescoço.

Importaria agora definir as caraterísticas da iluminação1 , do ruído, da temperatura, da qualidade do ar (a humidade de 50% é importante para, entre outros fatores prevenir a secura ocular).

O leitor é portanto convidado a obter mais informações, consultando a bibliografia.

 

 

Fig. 3 - Posturas correta e incorreta do utilizador.

Autore(s)

Médica Oftalmologista
Coordenadora da Linha de Investigação em Anatomia e Ilustração Científica. CIEBA/ Faculdade de Belas Artes da Universidade de Lisboa